terça-feira, 2 de março de 2010

A carta



Há apenas o silêncio e uma noite dolorosamente escura. Para lá das montanhas
um espaço violeta faz rascunhos no céu que se pinta de estrelas - invadem os
meus olhos como as bolas de naftalina que existem no roupeiro que fiz à medida
para a alma. Mas ela é de um tamanho imensurável e explodi no grito da tua
ausência.
Esqueceste-me ou queres ingorar-me para me magoar sem que eu saiba porquê. Não
sei construir impérios e jogos de estratégia são como uma selva indecifrável
que me ata com força à loucura.
Pergunto-me vezes sem conta a razão para me sorrires da tua foto que pendurei
na parede - aquela que tirei à muito tempo - quando o santuário acalmando o
meu coração tinha a voz de fundo dentro de mim, e o porquê de ser agora, não
mais que um simples verme perdida na lama?
OS dias amontoam-se e fazem buracos no corpo como se disparasses uma arma de
calibre destrutivo e se pudesse vislumbrar através do meu corpo a paisagem e
o céu azul; o vento e as nuvens correndo para longe.
O mar ondula com marés vivas, águas poderosas contra as rochas que olho com
nostalgia, incrédulo, sem esperança. As noites são cada vez mais frias e a
brisa marítima que me entra pelas narinas tem uma magia negra que me provoca
náuseas e me deixa desmaiado na areia.
A luz do farol apagou-se. Viajo num barco, à deriva de mim. Sou passageiro
único de uma viagem que parece não ter fim. Essa viagem a que chamam saudade
é muda, cega e surda. Não tacteia a minha pele nem sinto o seu perfume. Mas
o coração apertado dói. Imenso.
Às vezes penso que o amor me trouxe a sina da crueldade. A paixão rompeu o meu
sossego, mas deixei de conseguir morder os lábios doces com a ternura das horas
mais harmoniosas. Por isso grito do alto das falésias, mas o meu grito é
demasiado ferido para se ouvir.
Descobri que estou cada vez mais sozinho. Que perdi em todas as palavras o
sentido que poderia ter a vida na sua plenitude. Já não posso voar. Apenas
uma asa me sai das costas e vislumbro o abismo cada vez mais amplo. Não há
janelas no meu quarto, mas também deixei de ver o luar.
Hoje sei que não sou amado por ninguém. Vivo com as intempéries que me vão
secundando nas minhas palestras ao espelho. Nesses momentos tudo está ainda
mais ao contrário, e a luz ténue vai fugindo...
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1 comentário:

  1. e lindo este teu poema e sei que e muito sentido. mas ha quem te ame, nem que seja como um amor de irma e amor, por isso nao estas so nem nunca estaras

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